segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Até tu Marilza?

Carlos como todas as noites, reclamou com a esposa.
- Este jantar está uma droga, carne de panela de novo Marilza?
- Foi o que deu para comprar com a mixaria que você deixou pela manhã.
- Dê seus pulos mulher, use a criatividade.
Marilza terminou de servir o jantar contrariada, mas preferiu calar-se a ter que discutir na frente dos filhos.
- Marilza, Marilza, você não é como antigamente, virou uma relaxada que não cuida do marido, só pensa nos filhos e em si própria.
-Carlos, não fale assim, faço o que posso para cuidar de você da casa e de nossos três filhos, mas não consigo fazer milagres com o dinheiro que você me dá para o supermercado, e quanto a roupa, passei o dia todo com nosso pequeno ardendo em febre.
Enquanto explicava-se, o filho doente choramingava em seu colo.
-Não agüento mais você, nem essa casa.
Saiu batendo a porta. Pensou que vida maravilhosa teria longe dali, com paz, silêncio e sossego.
Já estava decidido. Esperou sua esposa sair para levar as crianças na escola, entrou apressado, tirou a mala empoeirada de cima do guarda-roupa e recolheu todos seus objetos pessoais, roupas, sapatos, escova de dente, documentos e todo mais que cabia na mala. Escreveu um bilhete desejando-lhe boa sorte.
Saiu feliz da vida, com o coração batendo forte de alegria, mal podia acreditar na sua audácia e coragem, como se ainda fosse um adolescente. 
No mesmo dia, alugou um apartamento mobiliado próximo ao trabalho, não era bem o que imaginava, mas não tinha muitas opções.
Foi até o mural no hall do prédio e pegou alguns telefones de empregada doméstica e outros de restaurantes que entregavam comida pronta. Ligou para a primeira, desligando rápido quando informou-lhe o preço.
Entrou em pânico e voltou para seu apartamento praguejando contra todas empregadas do mundo. Já estava noite, seu estomago roncava, resolveu pedir uma comida tailandesa, "cozinha especializada, entrega rápida", dizia o panfleto.
-Ótimo, pensou, é o que preciso, amanhã será um novo dia.
Duas horas depois, após inúmeros telefonemas reclamando a demora, chega sua comida, fria e insossa. Engoliu depressa, como se aquele fosse o melhor prato já experimentado.
Deitou-se. Precisava relaxar.
Sozinho e com frio, havia esquecido que uma casa mobiliada não tem roupa de cama, muito menos um edredom quentinho, nem uma esposa carinhosa e filhos sorridentes e felizes pulando em cima dele.
Sentiu um aperto no peito, uma tristeza sem fim e saudades, muitas saudades.
- Amanhã, volto para casa. Marilza é um anjo, sempre foi, ela há de me perdoar, serei o melhor marido e pai do mundo.
No dia seguinte, saiu atrasado, pois esquecera que não tinha mais sua esposa para lhe acordar, muito menos para preparar seu café da manhã.
-Atrasado, cansado e com fome. - pensou - o que poderia ser pior?
Depois de um dia exaustivo de trabalho, foi direto para a casa onde morava, seguiu confiante pelo trafego, cantarolando, imaginando como sua esposa ficaria feliz em reencontrá-lo. Comprou-lhe até flores.
Ao abrir o portão, notou que seu cão não veio recebê-lo, “provavelmente, está dormindo”, pensou, abriu a porta devagar, queria mostrar-se calmo, sereno e arrependido, por um momento um frio na espinha lhe causou náuseas ao pensar que poderia ser tarde, mas logo acalmo-se, ao lembrar como Marilza o amava.
Largou a mala, imaginou sua bela esposa correndo e abrindo os braços para ele, chorando, dizendo como sentiu sua falta. Mas nada aconteceu.
Começou sua busca pelos comados, na esperança de encontrar alguém, ouvir algum barulho, qualquer coisa. Silêncio.
O mesmo silêncio que Carlos tanto almejou e sonhou. Seguiu em direção ao quarto do casal, a cama estava do mesmo jeito que deixara naquela manhã que foi embora, abriu o guarda-roupa, com o coração apertado. Estava vazio.
Correu para o balcão da cozinha na esperança de um bilhete, mas não o encontrou.Percorreu por cada canto aflito a procura de um sinal, ao menos uma carta de despedida. Não achou.


Sentou no chão da sala, levou as mãos à cabeça, olhou fixo para a fotografia emoldurada pendurado na parede da sala e chorou, como vira sua esposa chorar tantas outras vezes.

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